COMO CHEGAVAS do casulo,
-inacabada seda viva! –
tuas antenas – fios soltos
da trama de que eras tecida,
e teus olhos, dois grãos da noite
de onde o teu mistério surgia,
como caíste sobre o mundo
inábil, na manhã tão clara,
sem mãe, sem guia, sem conselho,
e rolavas por uma escada
como papel, penugem, poeira,
com mais sonho e silêncio que asas,
minha mão tosca te agarrou
com uma dura, inocente culpa,
e é cinza de lua teu corpo,
meus dedos, sua sepultura.
Já desfeita e ainda palpitante,
Expiras sem noção nenhuma.
Ó bordado do véu do dia,
Transparência anêmona aérea!
Não leves meu rosto contigo:
Leva o pranto que te celebra,
No olho precário em que te acabas,
Meu remorso ajoelhado leva!
Cecília Meireles
In Retrato Natural
tuas antenas – fios soltos
da trama de que eras tecida,
e teus olhos, dois grãos da noite
de onde o teu mistério surgia,
como caíste sobre o mundo
inábil, na manhã tão clara,
sem mãe, sem guia, sem conselho,
e rolavas por uma escada
como papel, penugem, poeira,
com mais sonho e silêncio que asas,
minha mão tosca te agarrou
com uma dura, inocente culpa,
e é cinza de lua teu corpo,
meus dedos, sua sepultura.
Já desfeita e ainda palpitante,
Expiras sem noção nenhuma.
Ó bordado do véu do dia,
Transparência anêmona aérea!
Não leves meu rosto contigo:
Leva o pranto que te celebra,
No olho precário em que te acabas,
Meu remorso ajoelhado leva!
Cecília Meireles
In Retrato Natural